Um rio morreu. Sete pessoas (até agora identificadas), também. E o que acontece com os funcionários de uma empresa que foi a responsável por, talvez, a pior tragédia ambiental no país?
O termo do momento para quem trabalha com gestão de pessoas é “orgulho de pertencer”. Essa é a variação mais recente do tal “sentimento de dono”, que por sua vez é uma atualização do surrado “vestir a camisa da empresa”. Em casos extremos, esse orgulho transforma o nome da empresa no sobrenome do funcionário. Você passa a ser não o Marcio Fernandes, mas o Marcio da Elektro, por exemplo.
Quando tudo vai bem em uma companhia, o engajamento e o orgulho de pertencer a uma empresa serve para empurrar as metas e projeções e ter certeza que os colaboradores estão empenhados e produtivos. Mas e quando tudo vai mal?
A Samarco, uma joint-venture entre a Vale e a BHP Billiton, dona da barragem rompida responsável pelo acidente ambiental em Minas Gerais, está na edição mais recente do guia 150 melhores empresas para você trabalhar. Com práticas e políticas de RH sólidas e consistentes, sua presença ali é incontestável. Os funcionários podem depositar até 9% do seu salário na previdência privada da companhia, que dobra o valor na conta de cada um. Em seu perfil no guia, escrito pela jornalista que visitou a empresa, o diretor de RH da Samarco conta que um dos seus maiores problemas era manter os funcionários, superqualificados, motivados. Era.
Agora, a Samarco tem outro problema (além é claro de toda responsabilidade assumida pela tragédia): a cegueira causada pelo orgulho.
Na semana passada, uma página foi criada no Facebook para dar apoio à Samarco. Ao que tudo indica, ela foi criada não pela empresa, mas por funcionários. Com o título “Somos Todos Samarco”, gerou revolta e recebeu muitos comentários – negativos, em maioria.
Lembra bem a iniciativa dos funcionários da Odebrecht, que também se viram até a cintura no meio de um outro tipo de lama. Em junho, os funcionários organizaram um ato de apoio à empresa, acusada na Operação Lava Jato. O presidente da empreiteira, Marcelo Odebrecht, havia sido preso dias antes. Em apoio à companhia, 50 pessoas foram para a frente do escritório, na Zona Oeste de São Paulo, usando vermelho – a cor da logomarca da companhia. Com cartazes onde se podia ler “Somos todos Odebrecht”, os funcionários aplaudiam e gritavam a palavra “orgulho”.
Claro que nos dois casos, na Samarco e na Odebrecht, há muitos funcionários que não podem ser responsabilizados pelos danos que foram causados (um ao meio ambiente, outro ao meio político e econômico). Não tenho dúvidas de que a maioria desses funcionários trabalhou a vida inteira com ética e integridade. Também não tenho dúvidas do dilema que os funcionários vivem em uma situação como essa. E agora? Vestir a camisa ou preservar o seu nome, recuperar seu próprio sobrenome e desvincular-se da imagem da empresa? Nos dois casos, os funcionários (ou simpatizantes, já que não ficou claro quem criou a página de apoio à Samarco) não esperaram nem a conclusão dos devidos inquéritos e optaram pela primeira opção. Erraram.
“Enquanto houver dúvida sobre a ética da empresa, o ideal é manter uma posição neutra”, disse Laís Passarelli, sócia de uma consultoria, em entrevista para a matéria Currículo manchado, publicada pela VOCÊ S/A, em agosto.
Quem trabalha em uma empresa investigada deve evitar comentários públicos sobre questões polêmicas – defendendo ou criticando o empregador. Em boca fechada, afinal, não entram moscas.
Se você está nessa situação e quer sair da empresa, o ideal é acionar a sua rede de contatos pessoal, em vez de procurar por vagas na internet. E se, por outro lado, você trabalha em uma empresa alvo de investigação, mas pretende continuar onde está, guarde a tal da camisa. Pelo menos por enquanto.
Por Mariana Amaro – Repórter na Revista Você S/A